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Será preciso mais?



Por Gustavo Corção, publicano n’O Globo em 20–09–1973


A FRAGOROSA derrota da experiência socialista no Chile vem acrescentar mais um ponto à dúzia de fracassos já devidamente comprovados e registrados na História. É o caso de perguntar se será preciso mais cem, duzentos, mil esfomeações para que o mundo inteiro comece a desconfiar da evidente insanidade da maldosa utopia socialista? Sim, maldosa. Há loucuras e utopias generosas, mas o socialismo tem a terrível crueldade da falsa generosidade. Marcel de Corte, numa carta de agradecimento dirigida anos atrás ao Padre de Nantes, dizia que não há nada mais cruel do que o abstrato amor dessas esquerdas.


O CASO do Chile teve várias feições semelhantes ao nosso. Começou pelo bom-senso caloroso das mulheres, que geralmente sabem melhor do que nós o que é humano, e o que é infra-humano ou desumano, e arrematou-se com a intervenção das "virtudes militares". O mundo, o planeta habitado está de parabéns com a derrota dos cubanos no Chile, e o Brasil, cujo exemplo certamente terá estimulado as mulheres e os soldados, merece especiais aplausos pelo que fez e certamente fará pela nação irmã.


MAS o caso do Chile desenrolou-se com mais dramática intensidade do que o brasileiro por causa da deletéria ação da mentalidade democrata-cristã e da ainda mais deletéria ação de Eduardo Frey, o grande responsável pelos sofrimentos do Chile e pelo sangue derramado na sua redenção. Também contribuíram para protelar a intervenção militar os católicos ditos de esquerda e mais especialmente os bispos, arcebispos, cardeais e núncios que, ao invés de despertar o patriotismo chileno, ao contrário tudo fizeram para adormecê-lo com cantilenas de falsa prudência e lemas de falsíssima doutrina.


COMO é cansativo ter razão, dizer que tivemos razão, lembrar que tivemos razão quando tantas vezes dissemos que o sol alumia, a água molha, que o socialismo fracassa, e que o socialismo em adulterino conúbio com o catolicismo apodrece! "Tudo isto exaure, tudo isso cansa", gemia Machado em tempos bem mais amenos.


A JUNTA militar, que hoje governa o Chile, terá tarefa mais difícil do que a nossa por causa das protelações e do agravamento da situação econômica, mas esperamos que seja recebida com mais compreensão pelo mundo inteiro, que já se habituou um pouco a ver na solução brasileira o remédio adequado à doença do século. O fato principal, o fato maravilhoso que temos diante dos olhos é uma nova América Latina descongestionada. O Brasil — não falo com nenhum título de dirigente, mas com o modesto e altíssimo título de brasileiro que ama seu país sem desamar o resto do mundo —, o Brasil não deseja e não deve desejar nenhum ascendente ou nenhuma liderança entre as nações sul-americanas: ele deve desejar o acerto político e a promoção do bem comum. Se conseguir tão elevados objetivos — e tudo no panorama político nos induz a esperar que consiga —, então a liderança será uma decorrência de tais acertos, reconhecida por todos os sul-americanos de boa vontade.


NO CASO presente ainda nos restam apreensões no que concerne à situação da Argentina. O meu nível modesto de homem comum me permite dizer desassombradamente meu desejo: a derrota de Perón nas eleições. O resultado desse pleito será um hemograma da situação argentina. Se Perón vencer, e se o figurino de Isabelita se configurar bem pelo de Evita, como o demonstrou um astrólogo oficial, então teremos de esperar que os argentinos acordem. O peronismo não é melhor nem menos destruidor que o comunismo de Fidel Castro. É verdade que na Argentina não existe um Eduardo Frey para perturbar os juízes, nem os refugiados brasileiros que, para nossa tristeza, colaboraram com Frey no empreendimento da chinificação da América Latina.


SE PERÓN vencer — quod Deus non avertat — teremos de esperar alguns anos para que se consolide na América do Sul o baluarte ABC contra a Revolução Anarquista que devasta a Civilização.


* * *


TORNO a perguntar aos intelectuais de esquerda e aos padres e bispos filocomunistas: Será preciso mais?


SEMPRE me pareceu misteriosa a força com que a utopia socialista resiste às mais refulgentes provas. No que concerne aos intelectuais, o fenômeno já foi parcialmente desvendado por Jules Monnerot em sua La France Intellectuelle. No capítulo Histoire Succinte des Intellectuels, Monnerot sintetiza o irrealismo em que se movem os "intelectuais" nesta fórmula: "Um traço comum aos "intelectuais" é que eles nunca tiram lições dos acontecimentos, ou melhor: eles os censuram." E com este mecanismo psicológico de "censura" defensiva, isto é, do processo de tapar o que não quer ver, Monnerot apenas descreve o velho processo moral chamado má-fé. O "intelectual", que em regra geral é um homem que vive profissionalmente da inteligência, sem ser muito inteligente, precisa possuir vários mecanismos de disfarce. Um deles, clássico e já encanecido, é o pedantismo. Outro mais moderno, mas já em caminho de operação plástica, é o esquerdismo. Daí sua soberba indiferença aos fatos: se os fatos provam monotonamente que o socialismo é uma falsa generosidade e uma estúpida teoria sócio-econômica, tanto pior para os fatos, porque o "Intelectual", não tendo vocação de mártir, não poderia jamais enfrentar a evidência da própria tolice, ou a evidência da vacuidade do socialismo, e mais especialmente do marxismo.

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