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XIV – Confissão – Os pretextos e o medo



III – Os pretextos e o medo

1 – Tenho vergonha demais


Esta é uma tentação terrível que usa amiúde o demônio, e um laço em que prende tantas almas!


Uma restituição do demônio – Um dia Sto. Antônio, Arcebispo de Florença (+ 1459), viu o demônio numa igreja, onde havia gente para confessar-se.


- Que fazeis aqui? - lhe indagou. E o demônio respondeu:

- Faço uma boa ação.

- Será possível?

- Sim, faço uma restituição. Quando induzi alguns desses cristãos a pecar, tirava-lhes o rubor para que pecassem francamente; agora que eles querem confessar-se, restituo-lhes o que tirei, a fim de que, por vergonha, calem os pecados.


***


Deve-se ter vergonha de confessar os pecados? Vergonha de os praticar, sim; mas nunca para os dizer!


A vergonha de um discípulo de Socrátes – Um discípulo de Sócrates, filósofo grego (+400 a.C.), entrou numa casa de pecado. Ao sair dali, viu passar o seu mestre Sócrates. Aí recuou imediatamente para dentro e se escondeu atrás da porta. Mas o mestre já o havia percebido, e gritou-lhe:


- Por que te escondes? Sai, pois, daí. Sair dessa casa não é vergonha; vergonha é entrar.


***


A confissão sincera é um bem; por que, então, se terá vergonha de fazê-la? Só do mal se deve ter vergonha. Diz S. Agostinho: “Que estultícia fazer-se uma chaga na alma, e não ter a coragem de medicá-la e curá-la com o bálsamo da confissão!”. E São João Crisóstomo: “Não te envergonhastes de te tornares pecador, e agora te envergonhas de te tornares justo?”.


E, afinal, não se trata absolutamente de manifestar em público os pecados; mas de os dizer a um sacerdote que já conhece todas as misérias e as culpas de que são capazes os rapazes e as mocinhas. Que direis de um enfermo que oculta ao médico o seu mal por vergonha? Não é um estulto?


2 – Os meus pecados são grandes demais


E com isto? Há, porventura, pecado que Deus não perdoe? Qualquer pecado, por mais grave, será perdoado se se confessa bem. Por isso, foi instituída por Jesus Cristo a Confissão. Jesus disse: “Não são os sadios que têm precisão do médico, mas os enfermos: Non egent qui sani sunt medico sed qui male habent” (Lc 5,31).


3 – O confessor repreender-me-á


E se assim fosse? O confessor deve também fazer admoestações... Mas não é verdade que repreenda; pois Jesus recebia sempre com doçura os pecadores e os perdoava; e assim deve fazer o sacerdote. Também ele receberá o pecador arrependido, como um pai acolhe a seu filho. E rejubilar-se-á o confessor, pois ganha uma alma para Jesus Cristo. Ele faz como os pescadores. Quando um pescador atira a rede e não apanha senão peixinhos, diz: “Oh! Que pesca mesquinha!”. Mas quando na rede caem peixes grandes, rejubila-se com a boa pescaria. O confessor é um pescador de almas, e goza quando a alma de algum rapaz pecador se livra das cadeias do demônio.


Um penitente de S. Luís Bertrand – A S. Luís Bertrand (+ 1581) fazia sua confissão um jovem que tinha muitos pecados graves. Este, toda vez que declarava um pecado, encarava o confessor, para ver as impressões; mas, com espanto seu, via sempre sereno aquele semblante. Finda a confissão, disse:


- Padre, tenho outro pecado... e o cometi agora.


O santo, nada surpreso, falou:


- Dizei-o também esse. O penitente acrescentou:

-Vendo alegre o seu rosto, julguei mal V. Revma., e pensei: Este confessor deve também ter cometido pecados feios como os meus.


Aí o santo:

- Meu caro filho, graças a Deus eu jamais cometi os pecados que tu dizes. Sabes por que eu estava alegre? Por ver a tua sinceridade e o teu arrependimento; eu via romperem-se as cadeias com que o demônio te mantinha preso; eu via os anjos a festejar a tua conversão. Eis porque me rejubilava.


O jovem depois contou este fato aos companheiros, para os animar a confessar-se com sinceridade.


4 – O confessor admirar-se-á... perderá a estima...


Primeiro de tudo: quem vos obriga a confessar-se a um confessor que vos conhece? Podeis procurar o confessor que desejais. E, afinal, admira-se, porventura, o confessor? Mas sabe ele, perfeitamente, que todos podem cometer algum pecado grave; por isso não se admira jamais de coisa alguma. Perderá a estima? Pelo contrário! Torná-la-á até maior, porque vê a vossa firmeza e a vossa humildade ao confessar as culpas.


“Qual a estima por mim?” – A S. Francisco de Sales, Bispo de Genebra (+1622), apresentou-se um pecador que tinha na consciência muitos crimes, e a ele fez com muito esforço a sua confissão geral. Ao receber a absolvição, disse ao confessor:


- Agradeço-lhe a sua grande caridade: mas agora qual a estima que terá V. Revma. por mim?


- Estais errado – responde o santo – após absolvição a vossa alma ficou branca como a neve, e sois caro ao Céu: por isso tenho por vós a estima que se deve ter por um santo.


5 – Mas... não manifestará depois o confessor a outrem os meus pecados?


Que estais a dizer?! Sabeis o que é o sigilo sacramental? É o segredo tremendo que o confessor deve manter daquilo que ouviu em confissão; e nunca há perigo de ser violado esse segredo. O confessor é obrigado a deixar-se cortar a cabeça, de preferência a revelar um só pecado que seja ouvido em confissão. Deus nunca permitiu que confessor algum, mesmo tornado louco ou mau, violasse o sigilo sacramental.


Houve tiranos que tentaram e forçaram confessores a revelar o que tinham ouvido em confissão; mas nunca o conseguiram; e os confessores assim tentados deixaram-se antes degolar.


São João Nepomuceno – Cônego de Praga (+1383), era confessor da mulher de Venceslau, rei da Boêmia. Esse rei malvado queria saber os pecados que a rainha havia confessado. Mas o santo não revelou uma sílaba. O rei, após muitas lisonjas e ameaças, mandou atá-lo e disse:


- Se não manifestas os pecados que ouviste em confissão, far-te-ei jogar dentro do rio.


E S. João retrucou francamente:


- Não posso!


Aí o rei fez jogar o santo, amarrado como estava, no rio Moldava, onde ele morreu. O corpo desse santo, reduzido a esqueleto, foi examinado mais de 300 anos depois; e se encontrou a sua língua ainda intacta, como quando era vivo. Com esse milagre, a todos patente, quer Deus glorificar o seu servo, mártir do sigilo sacramental.


6 – Direi o meu pecado mais tarde, ao morrer.


Míseros! Indo adiante assim, cometereis novos pecados e novos sacrilégios. Qual a ocasião mais bela do que esta, em que tendes a graça especial dos Exercícios e confessores alheios? Se agora não sois capazes de saltar um fosso, como saltaríeis mais tarde um rio? À morte? E se morrerdes subitamente? E se na morte perderdes a fala? Quem espera a morte para reparar às condições mal feitas, acabará morrendo mal.


A morte de uma penitente mentirosa – O Pe. Agostinho de Fusignano conta este fato. Uma senhora, que se confessava amiúde, calava sempre um pecado grave, com a esperança de confessá-lo mais tarde ou ao morrer. Enquanto isso, foi vivendo os sacrilégios por muito tempo, até ficar doente e no fim da vida. Foi, então, chamado o seu confessor. Mas a moribunda quando o viu, lhe disse:


- Chegastes a tempo para ver uma mentirosa penitente vossa ir para a casa do diabo.

- Confessai-vos bem agora, disse o confessor, e tudo se ajustará.

- Agora é tarde demais; não posso!


Assim repetiu, impaciente, aquela infeliz, e expirou.


Conclusão


1 - Queridos filhos, fazei bem as vossas confissões: dizei todos os vossos pecados, não coisas inúteis, mas só os pecados. Não diminuais o número; não caleis as circunstâncias que alteram a espécie do pecado; não vos acuseis só de pensamentos quando se trata de atos indignos. Dizei tudo. Se a isso não vos resolveis, ai de mim! Não tereis mais paz: tereis sempre uma cobra no coração. E depois? Se ocultais agora os vossos pecados ao confessor, sabê-los-á todo mundo no dia do Juízo. E depois? Quereis levar convosco os vossos pecados para o inferno? Lá não haverá mais tempo para remediar.


2 - Para não cairdes no laço terrível do demônio, fazei assim: o pecado maior dizei-o primeiro, como ensina S. Filipe Neri. Se afinal não vos arriscar a revelar certos pecados feios, dizei ao menos ao confessor: “Tenho um pecado que não tenho coragem de dizer, e não sei como dizê-lo”. Aí pensará o confessor em vo-lo tirar da boca.


3 - O remédio para as confissões mal feitas: a confissão geral. Quando alguém houvesse feito confissões más e sacrílegas, poderá ainda remediá-los? Sim, certamente. E como? Com uma confissão geral, isto é, de todos os pecados cometidos com o uso do raciocínio. São obrigados a fazer a confissão geral aqueles que nunca tiveram o propósito; muito mal aqueles que têm calado propositalmente os pecados; e devem fazê-la pelo menos a começar da última confissão bem feita.


Um capote mal abotoado – Tadeu, ao abotoar o seu capote que tinha seis botões, errou a casa do segundo, e assim continuando até o último botão, errou a todas; e o capote ficou mal abotoado. Que teve de fazer? Desabotoar o capote até o botão errado, e depois abotoá-lo de novo.


***


Assim é quanto à confissão. Se alguém houvesse, nalguma confissão passada, calado por vergonha algum pecado grave, que seja, essa confissão seria sacrílega, e não valeria coisa alguma; também sacrílegas eram todas as confissões feitas depois. E então, que fazer? Deve-se voltar atrás e renovar a primeira confissão mal feita e todas as seguintes, dizendo todos os pecados confessados e calados, e ainda os sacrilégios. Assim fica tudo remediado.


A confissão geral é boa coisa até para os que se confessarem bem, e todos vós deveríeis fazê-la nesta oportunidade dos Exercícios Espirituais. Fazendo um exame de consciência melhor, encontrareis muitas faltas em que talvez nunca pensastes. Vendo, afinal, juntos tantos pecados, concebereis uma dor mais viva e fareis um propósito mais firme de não os cometer mais. Quando, afinal, estiver a vossa alma revestida da graça de Deus, tereis maior vontade de fugir dos perigos e das ocasiões de pecar, para não maculá-la de novo.


Assim, começareis uma vida mais santa; garantir-vos-ei o perdão de Deus; tereis a paz da consciência; preparar-vos-ei para fazer bem a Sagrada Comunhão; e, enfim, se tiverdes de morrer, morrereis com o coração cheio de consolações, por estardes certos de ir à posse do Paraíso.


(Extraído do livro A Palavra de Deus em Exemplos, G. Montarino,

Do original La Parole di Dio per la Via d’Esempi)

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